quarta-feira, 11 de junho de 2014

11-06-2014 - 88 ANOS - PARABENS DONA APARECIDA

Foi exatamente nesse ou melhor naquele 11 de junho bem na metade da primeira metade do século passado, apenas 2 anos após a fundação de Guapé, que o seu primeiro choro ecoou pelas paredes da Casa Grande, não longe das barrancas do Rio Grande, no Pontal em...1926! 

Da menina moça ou da moça mulher, que adorava os domingos à tarde, porque era quando podia "fugir" para um bailinho na vizinhança, enquanto o pai, autoritário e bravo, se encontrava na missa de domingo, em Guapé!


88 anos de um percurso de dedicação e de muita devoção - Casamento arranjado, dali pro Mundo Novo pra acolher tempos depois, seu primeiro rebento, eu. 

Hoje, na sua presença quase "ausente" ficamos as perscrutar o menor dos gestos, o mais leve sorriso.
Arrancar-lhe algumas poucas palavras é motivo de alegria por longo tempo, quando retornamos às nossas casas, em outras cidades! 

Parabéns mamãe e que Deus lhe dê ainda muita saúde pra continuar forte no meio de nós!

segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

FORMATURA ANDREIA - BAILE DE GALA

Foi neste sábado, 11.1.14, no já conhecido Castelinho da bela e charmosa FRANCA-SP. A seguir imagens, vídeos de registros para guardar e recordar. A festa estava linda. Obrigado da Família toda para a Andreia, para a Alina, para o Guri e para a Consuela - todos contribuíram de maneira caprichosa para que tudo aquilo pudesse se tornar
 
 
 
 
 
 
 
 
 
realidade!

quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

LIVRO DO ZÉ LAU - Minha Historia

Para quem ainda não conheceu este livro uma oportunindade


Apresentação do Livro
Quando você sentir a necessidade de registrar as suas lembranças significa que chegou a maturidade. Na maturidade você começa a repetir os seus comportamentos, com a enorme vantagem de poder escolher somente os que você quer adotar (Wenceslau AVILA)
O que pereniza a memória dos grandes homens não são os seus filhos e sim as suas ações (Wenceslau AVILA).
A morte tem a vantagem de apagar os defeitos e realçar as qualidades. O ausente elogiado é um ausente morto. Isto é tanto mais verdade, quanto mais intenso for o relacionamento entre as pessoas, principalmente se, entre elas existiram laços familiares.
Esta introdução, que em uma primeira leitura, aparenta dura, insensível, no fundo é uma grande profissão de fé, da crença de que nós somos essencialmente bons. Significa ainda que a natureza é, além de boa, positiva e que as coisas ruins, negativas, tendem a ser esquecidas mais depressa.
Os defeitos de nosso pai, grandes ou pequenos, não nos interessam mais. Queremos nos lembrar de seus grandes momentos, de suas grandes ações e não de suas fraquezas ou de seus pecados.
Ler estes seus escritos, tão sinceros, realistas e precisos, é uma viagem mágica a um passado, ao mesmo tempo próximo e distante. Próximo, porque muitos de nós, o vivenciamos e distante, porque resgata um modo de vida quase inimaginável nos dias atuais.
O interesse na sua leitura, em meu ponto de vista, é duplamente gratificante, uma vez que atende ao saudosismo dos que conseguem reproduzir em suas mentes os cenários descritos e atende também o olhar, atento e curioso, dos que não querem perder o contato com as suas origens.
Nosso pai deixou a sua marca porque soube descobrir o seu caminho. A sua trajetória foi única e invejável, tanto pelo que conquistou, quanto pelo que nos legou, em exemplo de persistência, de obstinação, em suas idéias e compromissos. Por mais de uma vez, demonstrou com suas ações, que tinha valores sólidos para os quais arriscava a até a sua própria vida, como o seu direito à propriedade ou de liberdade, em ir e vir.
Desde jovem enfrentou desafios, correu riscos, buscou alternativas. Destemido, chegou até os limites da coragem, para garantir os seus direitos mais sagrados.
Grande visionário, apesar das limitações lutou com infinita paciência, para dar aos seus numerosos filhos, uma formação adequada, certo de que somente a educação molda pessoas equilibradas, fortes e felizes.
A sua trajetória foi invejável, em todas as dimensões, como empreendedor, como pessoa e como homem.
Fica o modelo, para as nossas gerações de agora e que ainda virão.
Com orgulho,
Wenceslau AVILA (o primogênito)
Campinas – fevereiro 2010.
PAPAI
À todos aqueles que conheceram o Zé LAU e que certamente irão identificar cada gesto, cada movimento seu, neste texto, em sua homenagem - 8 anos após a sua morte.
Com seu velho paletó, ele ia,
Fizesse calor, fizesse frio
A sua missa aos domingos.
Nos últimos tempos, as partidas
Eram sempre emotivas, pois
Entre uma benção e um abraço
Aqueles olhos marejavam.
Nas chegadas nunca estava,
Mas como era bom ver aparecer
Ou da rua ou do quarto,
Com aquele sorriso maroto.
Quantas vezes esperamos,
Quantas vezes a fome ardia,
E o patriarca não aparecia.
Crescemos em cidades distantes,
Ganhamos dinheiro, ganhamos amigos,
Mas ao voltar às origens,
Nos curvávamos humildes.
A sua força parecia invencível,
Impensável alguém que o contestasse,
Quando isto aconteceu, ele venceu.
Honesto e íntegro, nunca falhou
Com aqueles que o honravam,
Sempre foi justo.
Parecia uma fortaleza, mesmo
Quando os anos chegaram,
Era difícil imaginar que fosse,
Mais fraco do que nós.
A lucidez era tamanha,
Que tínhamos dúvidas daquilo,
Que afirmávamos, em nossa
Ignorância de urbanóides.
Ao seu lado nossa segurança
Era total, absoluta,
Nunca teve medo nem dúvidas.
Que alegria ouvir
Suas histórias, suas vivências,
Tão ricas e tão pródigas em detalhes.
Não sei se foi bom ou se foi ruim,
De repente nos faltou,
Sem saber se fugiu ou se de fato morreu!
Oito anos já se foram, mas
Parece tão presente, tão intenso
Nos seus firmes argumentos.
Porque não poder ter para sempre,
Hoje ainda órfãos, falta-nos
O líder, poderoso e autoritário,
Ainda dói a sua falta.
O vazio continua, aquele Lugar à mesa, que ninguém
Ocupou, é seu papai!
Wenceslau AVILA
Campinas – Natal -2008
!a.

Começo da minha Vida
Eu nasci em Guapé, na casa da minha avó, quando o relógio da matriz tocava para a missa do dia, doze e meia. Foi a hora que vim nascer no mundo. Em 1.1.1916. Naquele tempo as mulheres, quando ganhavam neném, guardavam um resguardo. Me levaram para a roça, quando tinha seis meses. Sofri sarampo, enfraqueci muito, com muito remédio. Tinha de tomar leite. Minha mãe me deixou no colo do João Lau, no rabo do fogão e foi tirar leite para me dar remédio. Quando ouviu um choro, veio correndo. Eu estava debruçado nas brasas. Meu pai veio, deu uns tapas no João Lau. Minha mãe tratava de queimadura com óleo de linhaça. Quando o cascão da ferida estava arrebitando minha mãe não teve coragem de fazer a limpeza e pensava que meu olho estava ferido. Chegou uma vizinha, pôs água na bacia e pediu a mulher que lavasse a minha cabeça, tirou o cascão, quando o olho apareceu perfeitinho(a cicatriz ficou). Minha mãe cuidou de cumprir a promessa que ela fez.
Vivendo na roça minha mãe sempre nos levava à Semana Santa em Guapé, no Congo e no Moçambique. Quando eu tinha 6 anos sofri uma febre, eu e o João Lau. Minha mãe mandava buscar o pai dela. Ele tratava de medicina. Ele mandou apanhar uma lata de água no rego, pôs na bacia e banhou nós dois. Minha mãe quase ficou doida, nos tirando da bacia e pondo na cama. Pôs bastante cobertor, nós molhamos a roupa duas vezes. A febre acabou de uma vez.
A Primeira Escola
Quando eu tinha oito anos, meu pai me pôs na escola, no Grupo de Capitólio, eu e o João Lau, por um ano (na casa da Cassiana). José Honorato e a Cassiana (a irmã do papai) brigavam muito. Um dia meu pai chegou e uma vizinha disse pra ele tirar a gente de lá. Fui estudar em casa com minha mãe e a Guiomar. Minha mãe foi em Guapé, arrumou um professor velho. Chamava Vitoriano.
A escola era na casinha da desnatadeira. Ele passava deitado no banco. Um dia ele mandou eu tirar um bicho nele, eu contei pra minha mãe. Ela não falou nada, no outro dia bem cedo, minha mãe falou para um camarada: “vai em Guapé levar o Vitoriano”. Ela falou para o Vitoriano: “um camarada vai te levar em Guapé, arrumei o senhor para dar aula e não para os meninos tirarem bicho no senhor”. A escola continuou em casa.
Quando eu tinha dez anos eu sofri febre outra vez. Foi buscar um médico em Capitólio. Pedro, pai do João Pretinho, é quem foi buscar. Foi a primeira vez que tomei injeção. Quando eu tinha dezesseis anos meu pai foi em Capitólio, encontrou um homem paulista, que estava escondendo da revolução (A Revolução de 1932). Meu pai contratou ele para dar aula pra nós. Eu, o Mário, o Francisco, o Antônio e a Mariinha, a caçula. Demorou uns dias, começam as aulas. Quando começou só deu aula um mês. Nós estudávamos o dia inteiro. De noite ele ensinava-nos a rezar. Ele falava que quando ele fosse embora eu continuava as aulas. Vencendo um mês, meu pai pagou ele quarenta mil réis. Ele falou que ia em Guapé comprar uns livros, meu pai ofereceu
dinheiro adiantado, ofereceu animal e ele não aceitou nada. Ele saiu de madrugada para o outro lado (que não ia pra Guapé e sim para Passos, talvez). Viram ele subindo a serra do retiro do José Evaristo, nunca mais nós vimos o homem.
O Primeiro Casamento
Quando eu tinha vinte um anos e meio eu casei com a Luzia, na igreja e no civil, dia 24 de junho de 1938. Dia 16 de abril (de 1939) nasceu o menino. Fiz uma casinha de esteio e parede de pau a pique e assoalho. Mudei pra ela dia 30 de julho de 1939. Morei nela, agosto e setembro. Quinze de outubro a Luzia ficou doente, mandei buscar um médico em Guapé, Dr. Coelho. Ele falou: tem que levar ela pra Guapé. Meus irmãos arrumaram o carro de boi, eu não saia da beira da cama dela. Nós saímos à meia noite e quando o dia estava amanhecendo, eu estava chegando em Guapé. Nós chamamos a mãe dela, que morava em uma fazenda em Boa Esperança. Dia dezessete, à meia noite a mãe dela chegou. Uma hora do dia dezoito ela morreu. Ela completou dezessete anos no dia dois de outubro. “Pensei que nunca mais tinha caminho para mim viver, mas Deus nunca esqueceu de mim. Mim deu outra então para mim viver (ilegível) feliz”.
Minha mãe pegou o menino para criar, eu continuei morando sozinho, trabalhando muito. Em quarenta e dois (1942) casou o Mario, meu irmão. Eu vendi a casa pra ele e voltei a morar na casa do meu pai. Eu, o Francisco e o Antonio tocávamos toda a lavoura de sociedade. Em quarenta e quatro (1944)
eu fui com a comitiva do “Beja” buscar uma boiada em Pihumy, que vinha de Araçatuba, mil bois.
A boiada não tinha chegado, eu fui para a casa do tio Frederico. Pousei e amanheci com uma febre enorme. Meu tio chamou o médico, o Dr. Osvaldo. Ele falou que era febre paratifo. Não vi rumo da boiada, nem de boiadeiro. Meu primo Vico levou o burro para o pasto dele, fiquei três dias de cama. Chovia muito e um dia minha tia “Aninha” me tratou como se fosse filho dela. Ela me tratava de Zézé da comadre.
Quando me levantei, naquela magreza, minhas primas riam de mim, do jeito de andar. Chegou o Marcílio Abreu com uma carta do Chiquinho Ávila, farmacêutico, falando pra eu vir embora com o Marcílio. Eu tinha no bolso uma nota de quinhentos réis, eu falei com meu tio, o senhor me da cinqüenta reis pra eu levar e o senhor fica com os 500 réis, para acertar o médico e a farmácia, quando eu mandar buscar meu burro eu mando mais dinheiro.
Saí com o Marcílio num Fordinho de mola de aço. Chegando em Capitólio, com uma tempestade, o Marcilio me agasalhou pra eu não molhar e pousamos na pensão. De manhã nós saímos naquela estrada ruim. Dobrando o alto da Batalha avistei o Rio Grande. Estava muito cheio. Cheguei em Guapé na casa do João Lau, meu irmão. Ele também tinha sofrido a paratifo. Fiquei oito dias na casa dele e depois fui pra roça. Isto foi em janeiro de 1944, em maio de 1945 eu comecei a sofrer da vista.
Viagem para Campinas
Fui para Campinas (tratar da vista). Fui a pé até a Barra Velha, tomei um caminhão que levava creme pra Passos. Cheguei duas horas da madrugada e fui direto pra estação, tomar o trem às três horas. Cheguei em Campinas às cinco horas da tarde. Quando saí da estação, aquela porção de agenciadores gritando, mas eu não liguei. Chamei meu maleiro e mostrei o cartão da pensão mineira. Ele pegou minha mala, colocou na cacunda e saiu depressa e nem olhava pra traz e eu com medo de perder ele. Chegou na porta da pensão, ele desceu a mala e me mostrou a placa. Perguntei quanto era: três mil reis. Pensão Mineira na Andrade Neves.
No outro dia o agenciador me levou no médico Dr. Ataliba Camargo. Ele falou que era inflamação no nervo do olho. O nervo ia secar, acabava a dor, mas acabava a vista. Fiquei tratando durante dois meses.
Em maio de 1945 comprei a Fazenda Dourados em sociedade com o Lindolfo. Ele (depois) “quiabou” (=desistiu), mas eu agüentei o negócio sozinho. Coloquei outros sócios, Antonio Soares, José Antonio mas me desgostei. Eu tinha comprado uma invernadinha e fiquei na beira do rio. Setenta e três alqueires eram muito pra mim. Dei sociedade para o Domingo Evaristo, meu cunhado (marido da tia Julieta). Fiz a divisa com cerca de 4 fios de arame, com mourões de amoreira. Arei com arado de boi. Plantei milho, feijão, arroz. Quando estava perto de colher eu troquei com o Domingo pela fazendinha dele (no Rodrigues). Ele me voltou dezessete contos. Esta permuta foi feita em 11 de maio de
1946. Fiz um crioulo morar na fazendinha, o nome dele era João Bertolino.
Morte do Juquinha
Na noite de nove para dez de agosto (1946) meu menino ficou doente. De manhã cedo eu e minha mãe saímos com ele para o Guapé. Chegando na casa do José Garcia, mandei chamar o médico, Dr. Coelho e ele veio examinar o menino e disse que era tétano. Em Guapé não tinha antitetânica, mandei o Antonio Martins buscar em Capitolio, de cavalo. Viajou a noite inteira, chegou cedo com o remédio, mas não adiantou nada. No mesmo dia ele morreu, dia dez de agosto de 1946, com sete anos e vinte quatro dias.
Trabalho em São Paulo
Entreguei a fazendinha para o crioulo olhar dia vinte e seis de agosto e saí num caminhão que levava creme para o Carmo, em cima das latas. Pousei no hotel do José Matilde e quatro horas da madrugada eu sai no ônibus. Pegar o trem de ferro em Gaspar Lopes, trem que sai de Muzambinho. No trem eu encontrei um conhecido, Vovô do Viana, do “Trabanda”(ilegível), fomos juntos.
Chegamos em Cruzeiro dez horas da noite. Pousamos, no outro dia cedo pegamos o ônibus para Guará e em Guará pegamos o bonde elétrico até Aparecida. Fiquei 4 dias. Dia 31 de agosto eu fui
para São Paulo. Saí as duas horas da tarde. Fui na Central. Cheguei as sete horas da noite na estação do Norte, hoje estação do Brás. Pousei e no outro dia fui para São Miguel Paulista.
Procurei quarto, pousei, no outro dia, dois de setembro eu me apresentei no escritório da Nitroquímica. Passei em todos os exames e depois do meio dia eu trabalhei na companhia. Trabalhei o mês inteiro, tinha cinco por cento de bonificação. Mas eu só tirei o mês de outubro. Eu andava muito. Fui para Santos, nadei na Praia do Gonzaga. Meu companheiro, José Ambrozinho. Eu trabalhava como pintor mestre, reformando a casa dos chefes. Eu já era pintor.
Em janeiro me mandaram para Mogi das Cruzes, pintar a Fazenda Rodeio. Eu gostei muito, lá tinha vaca de leite, o administrador me perguntou se eu tinha medo de pousar sozinho, falei que não, mas ia pousar com os camaradas no barracão. Pôs minha cama numa casinha toda confortável perto da casa grande que eu ira reformar, a casa onde os chefes iam descansar. A chave da casa grande ficava comigo.
Eu pagava pensão na casa de dois velhos. Pagava dez mil reis. A companhia descontava cinco na minha conta, preço do restaurante. Outros cinco a companhia pagava. Lá eu consegui uma licença para ir ao Rio, o Zé Brinquinho estava lá no Regimento Sampaio. Fui em Niterói conhecer, antes de fazer a ponte. Isto foi em janeiro de 1947. Junto comigo andava um crioulo aqui de Guapé. Chamava Nei. Voltou para São Paulo.
Continuei trabalhando na fazenda Rodeio e terminamos a casa grande e fui reformar a casa do administrador. Ele se chamava Raimundo e a mulher Aparecida. A primeira vez que telefonei
naqueles telefones de canudo na parede. Fiquei dois meses na fazenda Rodeio. Terminamos e voltei para São Miguel Paulista em março “marquei contas”, eu ia para o Rio Grande do Sul.....(ilegível). Falei para meu companheiro, eu não vou mais, vou em Guapé, despedir do meu pai e minha mãe porque se eu for lá ( para o Rio Grande do Sul) é capaz de eu não voltar (mais). Minha mãe fez novena pra São José (pra eu não ir embora).
A Volta pra casa
Vim embora, saí de São Paulo, pousei em Passos, peguei um caminhão que vinha buscar creme em Guapé. Quebrou no caminho. Pousei em Alpinópolis. Sai de Alpinópolis dia 18 de março, pousei na Vargem do Mizael e cheguei na minha fazendinha. Tinha um cavalo de meu pai na horta, fui no Bastião Evaristo, pedi um arreio emprestado e subi a serra. Cheguei no Zé Adelino com uma chuva enorme. O córrego encheu, tive que pousar e no outro dia saí e cheguei na casa do Mario. Ele falou: eu vou com você, quando a minha mãe estava fazendo o almoço eu cheguei. Era dia de São José. Todos ficaram muito satisfeitos com a minha chegada.
Meu pai saiu contando para os vizinhos que eu tinha chegado. Logo pegou a chegar gente de fora pra me ver. Naquele tempo ninguém viajava, quando saia um, era uma novidade.
Meu pai não queria que eu trabalhasse. Era só para administrar, mas eu peguei firme, comecei a vida de novo. Comprei um cavalo e logo troquei em uma mula. Na casa do meu pai trabalhava-se doze horas por dia e nós também. No corte de cana pra fazer
rapadura. Nós levantávamos às duas da manhã e trabalhava até tarde.
O dia de trazer rapadura em Guapé, saía muito de madrugada e esperava as vendas abrirem para entregar a rapadura. Na época da limpa de pasto sempre chovia muito, mas nós não escondíamos da chuva. Tinha uns camaradas que agüentavam, outros iam embora.
Na fazenda de meu pai fazia rapadura, fazia polvilho, tirava leite, desnatava e vendia o creme e o soro engordava porco, que era vendido em Guapé. Levava no carro de boi. Gastava seis horas de viagem, tinha três léguas. Tinha que ir de madrugada senão o sol esquentava muito e os porcos morriam. Nós íamos em Guapé, a cavalo. Se chegava mais tarde um pouco (de volta), meu pai perguntava se a missa estava mais comprida.
O Casamento com a Aparecida
Um dia eu fui em Guapé, um domingo e encontrei a Aparecida. Ela ia casar mas conversamos..(ilegível) ...mais agradável...Ela falou que sim...que se ela casava comigo. Eu perguntei se podia pedir em casamento, ela disse que podia, eu perguntei quem podia pedir, ela falou o tio Domingo (irmão do Antonio Evaristo), eu falei pode esperar. Falei com o Domingo e ele foi pronto. Marquei o dia delle ir e escrevi pra ela. Entreguei a carta pra elle e falei, primeiro entrega a carta para a Aparecida e pergunta a ela se pode pedir ( o casamento) mas é para trazer a resposta. Lá, o homem quando não aceita casamento ele fala que vai perguntar ao
burro, mas quero a resposta, mesmo que for do burro, a respeito foi para mim...(ilegível).
No domingo seguinte eu fui a Guapé, terminada a missa eu fui atender o chamado (do Antonio Evaristo). Quando eu estava no Campo do Zé Baio encontrei o “homem” (Antonio Evaristo). Eu falei: o senhor mandou falar pra mim e lá eu ia. Ele disse: pode chegar, as mulheres estão lá. Mas eu falei: o que eu vou fazer com as mulheres, não revolve nada. Ele disse: eu vou aqui, na Jacutinga e volto logo.
Eu cheguei lá, jantei, eles querendo soltar a minha mula, mas não deixei. Falei: eu vou embora. Tarde da noite chega o homem. Entrou para dentro, conversei um pouco. Falei: eu vou embora. Ele falou: você não vai soltar a sua mula. Aí pousei e no outro dia cedo peguei a mula, arriei. Entrei lá dentro para despedir. Não falei em casamento. O homem quando viu que eu não falava, ele disse: o negócio que você mandou falar, nós vamos aceitar.
Então eu vou (ilegível). Vou levar os nomes de todos, vou tirar a licença e a medida da aliança. Marcamos com o prazo de um mês. Eu fui em Pihumy fazer as alianças. Eles falaram com o Padre João, que mandou avisar que ia para Santa Catarina dia 25(de junho) e vai ficar um mês. Tinha que fazer o casamento antes dele ir ou depois que voltasse. O homem me perguntou o que eu queria, eu falei: então fazemos antes dele ir, está tudo pronto.
Mas tinha só quinze dias, foi nosso casamento dia 24 de julho de 1948. Ajustei o Vadinho Ávila para nos levar ao Pontal, num fordinho de mola de aço. Fui eu, Aparecida, a Maria do Juvenarinho (tia Maria), com três filhos e o José, do Antonio Evaristo. Foi pela linha até o Pontal. Depois desce a
linha, segue pela estrada, foi até o Areião. Tivemos que chegar a pé. Lá (na casa da noiva) tinha muita gente esperando. Meu pessoal também estava lá. Foi uma janta boa. Era em uma sexta feira. Pousei três noites. Segunda feira de madrugada nós fomos para a casa dos meus pais (no Mundo Novo). Logo, comecei uma casinha na beira do rio, perto da mina. Fiz a casa de adobe, de chão, quatro cômodos.
O primeiro Filho
...Lá onde o Lau nasceu em um de junho de 1949. No mesmo dia eu fui avisar o Antonio Evaristo, eles estavam incomodados. “Você vai com o Zé Lau, ele disse (para a vovó Raquel), tem que deixar o Tonho (Antonio – caçula), mas ele resolveu ir. Tinha no curral uns 20 animais, mas não tinha um que servisse para ir. Eu falei: meu cavalo é manso, pode ir nele. Me deram uma égua pra eu ir.
Pensei: esta mulher vai ficar, lá em casa, uns 15 dias. Mas não, ela chegou a tarde, pousou, no outro dia ela fez o almoço e me falou, agora você me leva em casa, o Tonho ficou sozinho. Eu fui levar ela, minha mãe e a Oscarina Aguiar ficou com a Aparecida. Minha mãe ficou com ela até ela poder trabalhar. Eu sempre trabalhava.
No dia dezesseis de novembro do mesmo ano, eu mudei para minha fazendinha. No carro de boi, subia a serra do Retiro. Aparecida a cavalo carregando o Lau, na cabeça do arreio. Chegando lá o Antonio Martins estava morando na casa. Mandei ele mudar, para a casa de despejo. Quando fez três dias que nós tínhamos mudado, chegou meu pai: foi ver se nós estávamos cobrindo ele (o Lau)
direitinho. Ele ficou alguns dias, me ajudou a fazer uma cerca de arame no pastinho dos bezerros. Ele já estava com oitenta e nove anos, dois meses e vinte oito dias.
Fui fazer a casa do Antonio Martins. Ele mudou pra casa dele e tomava conta das vacas. Tirava leite, os meninos dele pousavam lá em casa. Eu voltei a trabalhar no Mundo Novo, cuidava dos cafés, quando em janeiro de 1950, meu pai ficou doente. Chamou o Dr. Coelho em Guapé. Foi ele e Chiquinho Ávila, farmacêutico, foi de cavalo. Não tinha linha e a estrada era ruim. O Dr. Coelho falou: tem que levar pra Guapé. Amarraram dois paus na caminha e levaram ele carregado por 4 pessoas. Nós saímos com ele, domingo de madrugada. Não precisou chamar ninguém: o pessoal, quase todo o Mundo Novo acompanhou ele. Foi o último favor que ele recebeu do Mundo Novo. Nós agradecemos. Foi o Dr. Coelho e o Chiquinho encontrar com ele. Se encontraram no Angola, perto da Jacutinga. Aplicou uma injeção nele e acompanhou também. Continuou examinando ele. Minha mãe seguiu a pé, muito incomodada com medo dele não agüentar até o Guapé. Ao chegar, em Guapé, teve uma melhora.
A Morte de Wenceslau Avelino de Ávila
(1860 – 1950)
Na semana seguinte ele falou que queria fazer a doação para nós e pediu para a gente tomar as providencias. Entregamos para o Dr. Fonseca fazer os papéis; tudo muito enrolado. A segunda família não tinha quase nada, era tudo da 1ª. família. O Dr. Fonseca deu a idéia: vocês compram as partes, tudo da 1ª. família. Já tinha morrido duas filhas,
Maria Bárbara e Olímpia. Aí compramos as partes da 1ª. família. Pagamos 15 contos para cada parte. Os que tinham morrido, tiveram divididos os 15 contos com a família. A parte da Julieta foi paga por 30 contos porque ela tinha a parte do meu pai e da minha mãe. Meu pai..(ilegível)..mas o Dr. Fonseca apressou a escritura.
Na passagem da noite do dezesseis para o dezessete o Dr. Fonseca sentou-se de um lado da mesa, ditou a escritura e o escrivão foi anotando. O Itamar passou a escritura das compras que nos tínhamos feito. Meu pai assinou a escritura as duas da madrugada, “lumiou” com a lanterna para ele poder assinar. Os que tinha (bens) assinaram a venda para que tudo fosse terminado de madrugada.
Quando foi duas horas da tarde, meu pai morreu. Foi no dia dezessete de março de 1950.
Minha mãe voltou pra casa dela e nós ficamos juntos com ela. Eu continuei trabalhando nas minhas lavouras no Mundo Novo. Só ia em casa nos sábados e voltava segunda feira.
Quando a Cleida nasceu eu estava no Mundo Novo, arando terra. Deixei a Maria Muda lá em casa. Mandaram o Antonio Martins me chamar. Eu vim, cheguei e a comadre Zica estava dando o chá de canela para ela. Só fiquei em casa uma semana e voltei para trabalhar. Eu arava muito, com arado de boi. Plantava muito.
A Cleida nasceu em 10 de outubro de 1950. Quando a Cleri nasceu eu estava em casa. Busquei a Maria Muda (parteira) no Mato das Antas, na fazenda do Geraldo Mizael em 1952, janeiro.

O Trabalho Duro nos Cafezais
Minha mãe trabalhava muito. Socava arroz na mão...a mão de pilão, até limpar o arroz para tratar de camarada (empregado). Meu pai tinha muito camarada. Iam da Jacutinga e de outros lugares, pousavam, ficavam em casa a semana inteira. Meu pae tratava bem, dava tira-jejum, ia almoço no serviço e janta também. De noite tinha merenda, quando não tinha quitanda dava leite fervido com doce.
Quando era tempo de panha(colheita) de café, minha mãe ia para o cafezal. Os crioulos dos Olhos d´Agua e outros, ficavam em um ranchinho. A parede era de pau raxado (não rebocado). Nos sábados ia ella e uma camarada lavar a roupa e arrumar mantimentos para a semana seguinte. Meu pae puxava o café no sábado e eu ficava com elle em casa.
Em dez de agosto de mil novecentos e cinqüenta e três (data correta 1954) nasceu a Nini. Eu estava em casa. Em maio de mil novecentos e cinqüenta e cinco nasceu o Warlei. Com um ano e seis meses elle morreu. Em mil novecentos e cinqüenta e seis nasceu o Nero. Em dezembro (dia 20). Em fevereiro de mil novecentos e cinqüenta e sete morreu minha mãe (no dia dois).
O Mundo Novo
Eu fui criado no lugar mais isolado do município de Guapé, o Mundo Novo. Quando morria gente lá, chamavam o carapina para fazer o caixão, as costureiras para fazer as roupas. Adulto enterrava com roupa preta. Quase ninguém tinha roupa suficiente. Iam em Guapé buscar. Elles falavam
“buscar mortalha”. Traziam os enfeites para o caixão, enfeitavam com taxinhas douradas. No caixão pegava um na frente e outro atrás. No caminho elles trocavam, cada um carregava um pouco. Trazia para Guapé porque não tinha cemitério. Tinha gente que inchava os ombros. Tinha uns mais sabidos que falavam para o defunto...nós vamos te cortar na faca, tem dó de seus irmãos...
Cenas do Mundo Novo
Lá no Mundo Novo, quando uma pessoa calçava (colocar sapatos) eles perguntavam: está tomando remédio? Ninguém usava calçados. Nem homem nem mulher. Fizeram uma igreja nova e meu pae deu toda a madeira: travamento, caibro, ripa, portal. O piso era de cimento. A igreja pronta, o Padre João pediu ao meu pae um cruzeiro para fincar perto da porta da Igreja. Meu pae estava desanimado. Eu e o João Lau fizemos o cruzeiro fincamos perto da porta da igreja, onde o padre tinha mandado. Nos sábados e domingos tinha reza na igreja e o pessoal se reunia em movimento.
Um dia, duas mulheres pegaram de briga. A Miquelina e a Maria Muda (parteira da região). A Miquelina rasgou toda a roupa da Maria Muda. Foi preciso enrolar uma coberta nela para ella ir embora.
A Pitoresca Família do Manuel Bernardes
Lá no Mundo Novo nem os irmãos não combinavam uns com os outros. O Lindolfo com o Manuel Bernardes compraram umas terras em comum. Dividiram, e a divisa passava em um pau de jatobá, que tinha na beira do rio. Este pau era grosso, se serrasse elle daria muita madeira. O Lindolfo queria pregar o arame do lado do Manuel Bernardes. Para ficar sendo o dono do pau, o Manuel Bernardes queria o mesmo. Brigaram e mandaram chamar o José Bernardes, na Pedra Branca. Era o irmão mais velho. Elle veio e disse: o pau pertence aos dois, chama um carapina, passa quatro buracos no pau e passa o arame. Assim fizeram e fez a divisa.
No Mundo Novo não tinha vendas. Os fazendeiros é que forneciam alimentos aos pobres (pobres aqui ,tem o significado de pessoas que não produzem para o próprio sustento=sem terra) e elles pagavam com serviço. Iluminavam as casas com lamparina de querosene. Elles não conheciam o que era luz elétrica.
Um dia tinha um camarada com um filho doente e não tinha querosene para iluminar a noite. Foi na casa do Manuel Bernardes comprar meia garrafa de querosene. O Manuel Bernardes disse: eu não tenho querosene para vender, só se você me der três dias e meio de serviço para pagar o querosene. O camarada disse: está caro, mas preciso e, levou. Trabalhou os três dias e meio para pagar o querosene. Este camarada chamava José Luiz.
O Manuel Bernardes criou uma família grande lá no Mundo Novo. A mulher delle Maria Vitória começou a engordar muito e os cavalos não estavam agüentando ella e aí elle comprou uma mula. Um dia a mula caiu com ella. Ella se machucou muito. O
Manuel Bernardes falou: ella não vai mais, em Guapé a cavalo. O dia della ir, vai de carro de boi. Elles iam toda primeira sexta feira do mês. Assim fez. Pôs a mulher no carro de boi. O carreiro chamava Miguel Felipe e era preto. Na descida do morro do Guapé, elle tombou o carro, uma caixa rolou em cima della e machucou ella muito. O Manuel Bernardes disse: vou mudar pra Guapé. Aí comprou uma casa em Guapé, perto da conferência. Esta casa, a privada della era na horta. Tinha um buraco e um caixote por cima para a pessoa se sentar. E a mulher muito pesada, o caixote quebrou e ella caiu dentro do buraco e ella atolou até o pescoço. O Manuel Bernardes saiu na rua procurando gente para tirar ella. Precisou de cinco homens para tirar.
Os pescadores pediam ella pra rancar minhoca em um brejo que ella tinha no fundo da horta. Ella cobrava (vendia as minhocas).
A Historia dramática do Porto que não aconteceu
Meu pai sofria muito no Mundo Novo, quando nós éramos todos pequenos. Uma família, dos Modestos, tentava fazer um porto no fundo da horta de meu pae. Elle enfrentou. Esta família era grande. O velho chamava Joaquim Modesto e a mulher Candinha. Este pessoal se reunia no barranco do rio para atravessar. Minha mãe pegava um pau, o tio Artur também, este era irmão da minha mãe. Elle era cego de um olho. Elle pegava outro pau e ia para a beira do rio enfrentar o pessoal. Meu tio: Gustavo pode vir. E elles recuavam. Elles xingavam
mas iam embora. Depois voltavam do mesmo jeito. E meu pae nesta luta.
O tio Mizael mandou levar uma carabina com muita bala para o meu pae. O tio Evaristo era contra. Um dia um vizinho delles soube que elles vinham dar ronda na casa do meu pae, à noite. Elle veio avisar meu pae (minha mãe que contava). Meu pae e o tio Artur foram pousar no paiol. Com a carabina no colo um dormia e o outro ficava acordado. Se elles rodeassem a casa mandavam bala. Minha mãe lá dentro de casa com todos nós pequenos.
A casa tinha buraco na parede, minha mãe tapava com pano. Elles pousaram muitas noites mas elles não vieram. Elles.(ilegível)..
A comissão de Guapé com o tio Evaristo, junto com o Nico Silva, o Cassiano do Milico e o Estandear(sic). Elles eram três. A comissão deu para fazer o porto. Elles começaram a dar palpites, que fariam a estrada por um lado, pelo outro lado. Meu pae falou: esta estrada passa no rabo de vocês! Eu não deixo fazer porto no fundo da minha horta.
A Mudança para Pihumy
Foi em Pyhumi arrumar um advogado. Elle falou para meu pae: eu garanto a causa. O senhor sai de lá um ano e se elles invadirem, eu processo elles. Meu pai contou para o tio Frederico (irmão daMaria Cândida). Elle falou: cumpadre Lau, nós trocamos as casas. Nós vamos morar na sua casa e vocês vêm morar na nossa, aqui na cidade. Meu pae concordou. Nós fazemos a mudança só de roupa, a nossa e a de vocês também. Meu pae com o tio Frederico combinavam muito.
Quando minha mãe não esperava, chegou a mudança com a família do tio Frederico. A tia Maria chegou brincando com minha mãe. Assim ella contava. Arrumou a mudança, de noite fez a quitanda. A mudança veio carregada no animal. O mesmo animal levou a nossa mudança.
Moramos com as casas trocadas um ano. Isto foi em 1920, porque o Mario nasceu em Pihumy, em fevereiro de 1920, quando morava lá. A casa do tio tinha uma escada alta, eu me lembrava. Minha mãe dava umas garruchinhas de rebentar espuleta de papel. Eu sentava na porta com a garruchinha e ella perguntava o que eu estava fazendo, eu falava: eu quero matar os soldados.
Quando venceu um ano nós voltamos para a nossa casa. O pessoal já tinha “dizinerado”(desistido) do porto. Já estava vendendo as fazendas delles para comprar outras fazendas em Goiás. Compraram muito animal, levaram a mudança nos cargueiros. Fizeram jacá de taquara. Cada cavalo levava dois jacás. Cada jacá duas crianças. Levaram dois camaradas, o José Lourindo e o Manuel Pinto ...ilegivel..Levavam mais de um mês viajando. Nos dias de sábados elles falhavam para lavar a roupa. Compraram muita fazenda em Goiaz, mas esta família foi derrotada(sic?).
(Por causa de) negócio de porco na roça, mataram o velho Joaquim Modesto, e a mulher Candinha tomou um tiro no braço, quebrou e foi preciso cortar. O filho delle, José, mataram no caminho da roça. O João Candinho, deram um tiro no olho delle dentro de casa, pelo buraco da parede.
Wenceslau Avelino de Ávila
e José Lau
Meu pae nunca teve medo. Viajava por todo lado, ia buscar gado em Goiaz, não carregava nem um canivete no bolso. Meu pae tocava muita lavoura e camarada(nome dado aos empregados nas roças, a maioria diaristas) nunca levava marmita. A comida era feita na hora. Eu também tinha o mesmo costume. Camarada meu, eu é que tratava. Um dia um camarada levou marmita e eu falei para elle: você, de tarde, leva sua comida e você vai comer com os outros, feito na hora. Eu tocava serviço lá no Buracão e o cozinheiro ia na frente. Quando os camaradas chegavam o café estava coado. Elles tomavam café com merenda. A tarde ia a janta e elles trabalhavam até o sol entrar. Ninguém reclamava de nada. Quando a Nini nasceu nós estávamos dividindo a fazenda de meu pae no Mundo Novo. Foi em 10-8-1953 (o ano correto é 1954). Deu muito serviço fazer as divisas e limpar o pasto. Eu morava mais no Mundo Novo de que em casa. Quando era tempo de panha de café, nos íamos de carro de boi para o Mundo o Novo, apanhar café e secava (o café era secado em terreiros ao lado da casinha). O Antonio Martins ficava tomando conta da nossa casa e quando nos terminávamos a panha do café e secava. Nós guardávamos o café no quarto da casinha e nós voltávamos para a nossa fazendinha (100 alqueires!), nos Rodrigues. Viagem de Alegria, porque todos estavam com saudades da nossa casa. Aparecida (a Tida) do Antonio Martins sempre junto de nós, pajeando as crianças. Quando ella começou a trabalhar para nós ella só tinha 12 anos e (só) saiu para casar. Ella era madrinha da Cleida, de
representação. Quando o café era vendido, era transportado no carro de bois, até a Jacutinga ou Guapé, porque no Mundo Novo não tinha linha para ir caminhão.
Comprei a fazenda do Olho d´Agua em 6 de setembro de 1952, de sociedade com o Francisco Lau e no mesmo ano comprei a parte do Mario Lau, no Mundo Novo. Quando fez um ano comprei a parte do Francisco (no Olho d´Agua). Em 23 de janeiro de 1956 comprei a fazendinha do José Vicente de Melo, José Rufino. A primeira compra que fiz do Evaristo, no Buracão, foi em 28 de junho de 1956. Aluguei para o Mario Lau um ano, quando venceu o aluguel eu comprei o resto do pasto do Buracão, foi em 2 de dezembro de 1957.
Queimei o terreno para plantar roça no fundo do pasto. No outro dia o fogo incendiou no pasto. Queimou o pasto todo e mais um pasto do porto do Joãozinho Rodrigues, que estava alugado para o José Evaristo. Ele quis tratar contra (entrar com uma ação) e eu fui conversar com o Dr. Fonseca. O Fonseca tirou elle de idéia. Elle mandou o João Lau me procurar e (propôs) dar pasto para quarenta novilhas (por) um ano. Eu não concordei. Não paguei nada.
Abri lavoura no pasto, plantei muito. Na colheita, colhi os mantimentos, levei as vacas de leite, os porcos, soltei na palhada (depois que tira o milho ficam as ramas secas) . Desnatava o leite (tirar o creme do leite), vendia o creme e dava o soro para os porcos.
Quando era tempo de plantar, os porcos estavam gordos. Trazia para casa e vendia. Plantei no Buracão em 57-58-59-60-61-62-63. Eu aluguei para o José Evaristo dois anos. Vendi vinte vacas paridas, a vinte cinco mil cruzeiros. 15 vacas a quinze mil
cruzeiros, um touro por vinte cinco mil cruzeiros. O aluguel do Olho d´Agua , do Buracão por dois anos pela soma de um milhão e cinqüenta mil cruzeiros, com o juro de 1%, sem reforma (sem cobrar juro sobre juros ou sem possibilidade de prorrogar).
Mudança para Guapé
Mudei para o Guapé em 31 de janeiro de 1960, com muita chuva. Uma enchente enorme. Coloquei os meninos na escola. O Lau repetiu o terceiro ano. Estudou dois anos em Guapé. Fez o quarto ano em Guapé. Em janeiro de 1962 elle foi para o Carmo do Rio Claro. (Ele) estudou quatro anos no Carmo. E foi para a França.
Quando venceu o aluguel das fazendas eu voltei a trabalhar na roça. E os meninos continuaram estudando em Guapé. A Cleida e a Clere fizeram a quarta serie e foram para Passos. Entraram no Colégio Imaculada Conceição, colégio das Irmãs. O primeiro mês ellas moravam na casa do Mario Lau. Depois eu aluguei uma casinha na horta do João Lau. Retoquei a casinha e ellas moravam lá. Foi a Elza do Zorino morar com ellas.
Historia antes do Guapé existir
Este terreno que hoje é a cidade de Guapé, até na barra do rio Sapucaí com o rio Grande, pertencia ao bispado de São Paulo. Em 1723 houve uma lei de posses. O pessoal possiou e foi formando fazendas e povoados. O Capitão José Bernardes possiou muita terra: o Pontal até perto do Mundo Novo, até
perto da Barra (São José da Barra – a Barra velha), até perto de Santo Antonio. E elle morava ligado no terreno que elle doou para São Francisco. A mulher do Capitão José Bernardes se chamava Esméria. Ella estava tecendo no no tial (tear) de madeira e uma crioula, escrava, mexendo um taxo de sabão. A terra começou a tremer, cada vez mais forte, o taxo de sabão virou e entornou tudo. A Esméria ficou apavorada, com muito medo. Aí ella prometeu (que) se não houvesse nada ella daria um terreno para São Francisco, para fazer uma capela para a imagem. O tremor foi aplacando até que acabou de tudo.
Mas veio uma chuva enorme. A enxurrada descia pelas estradas do Pontal. Devia ser o morro do Guapé, que nós passávamos nelle. Assim dizia o livro antigo. Porque tudo que escrevi não é tirado da cabeça, é tirado no livro antigo.
Felisberto Arruda deu mais um pedaço de terra para “interar” (completar) o patrimônio. E mediram o terreno, fizeram a demarcação. Era mais ou menos dez alqueires. Fizeram a capela, colocaram a imagem de São Francisco.
O padre vinha de Nossa Senhora das Dores de Boa esperança. Celebrava a missa de vez em quando. Foi formando o povoado, até para ser arraial. Este arraial passou a pertencer a Nossa senhora das Dores da Boa esperança. Nas águas do ribeirão tinha muito daquela planta que se chama Aguapé. Então puseram o nome de Arraial do Aguapé, de Aguapé do Rio Grande.
Tudo que escrevi é tirado do livro antigo do meu avô.
José Rodrigues de Avila – o primeiro dos AVILAs
Naquela época, saiu da Espanha, quatro irmãos e se espalharam para o Brasil. Um chamava JOSÉ RODRIGUES DE AVILA. Ele ficou trabalhando nas fazendas. Os outros três não sei do nome delles. Foi para o lado de Belo Horizonte, outro para o Nordeste. Todos que tem sobrenome Ávila no Brasil são descendentes desses quatro homens.
Este José Rodrigues de Ávila vivia trabalhando nas fazendas, à roda de Guapé.
O Capitão José Bernardes, não tinha família (filhos), só tinha uma filha adotiva. (Ela se) chamava Conceição. Naquele tempo não usava namorar. Arrumaram o José Rodrigues de Ávila para casar com essa moça, Conceição. O Capitão José Bernardes dotou (deu como herança) ella com muita fazenda no Pontal, até o porto da Barra, até perto do Santo Antonio, até perto do Mundo Novo. Elle fez uma casa perto do Santo Antonio, lá chamava Campo do Meio. É onde morava o Augusto Lau. Esta casa era grande e era de chão, esteio de pau, a parede tinha dezoito palmos de altura, era barriada com barro, ripa de palmito e madeira toda de qualidade. O Augusto Lau morava nella. Eu conheci. O José Rodrigues de Ávila criou toda a família nesta casa. Tinha bastante filhos.
O Augusto Lau era meu irmão. Era vizineto (bisneto) de José Rodrigues de Ávila. Tinha um quarto de fechar escravos, um outro elle guardava milho e outro era chiqueiro de porco. Nas paredes tinha aquelas cabaças de arapuá, abelha brava. Tinha um oratório feito de madeira de cedro muito bem feito, cabia uma pessoa em pé dentro delle,
tinha as prateleiras de pôr os santos, tinha um mijolo (monjolo) perto da porta da cozinha e mais para baixo o munho (moinho). Muita fruteira na horta.
Na família do José Rodrigues de Ávila só tinha uma filha mulher, esta se chamava Bernarda. Eu conheci, já caducando. O meu avô se chamava Francisco Rodrigues de Ávila. Os outros filhos se chamavam Feliciço, pai da família dos Ciço, outro chamava Alberto, o pae da Tiluca do José Baio, o outro se chamava Aleixo, pae da Batista de Varistão (pai da Raquel). Elles eram primos. Outro se chamava João Rodrigues e era solteiro, morava junto com o Aleixo.
O Aleixo, emvinha trazendo um carro de milho do Mundo Novo, emvinha trepado no cabeçalho do carro, descendo a Capueira Comprida elle caiu na frente da roda do carro e morreu na hora. O candieiro (a pessoa que anda na frente do carro de bois) colocou elle em cima do milho e chegou em casa com elle morto. A mulher delle se chamava Dutra, a mãe da Batista. Passado um tempo, a Dutra casou-se com o João Rodrigues. Criaram mais filhos. Elles eram cunhados. O outro filho do José Rodrigues se chamava Manuel e foi o primeiro sogro do meu pae. O outro filho do José Rodrigues se chamava Ozéias. Era vizavô da familia do mudinho do Campo de Aviação.
O José Rodrigues não deixava os filhos sair de casa nem aos domingos. Lá na Cava, onde morava o Braga, tinha um fazendeiro antes do Braga. Tinha uma tropa para amansar, burro, mula. Elle arrumou um peão para amansar a tropa. Elle montava no burro e caía, montava de novo e caia. Falaram para o fazendeiro: lá no José Rodrigues tem um moço, elle vem aqui e desabusa esses burros.
O fazendeiro mandou o camarada lá. Este peão era o nosso avô Francisco Rodrigues de Ávila. Ele falou para o camarada: se o velho (o pai dele) for para Guapé eu vou lá montar nos burros. O velho foi para Guapé, elle foi. Chegando lá, veio a tropa para o curral. Elle pegou o mais bravo. Arreou e montou. O burro tampou a saltar. O fazendeiro falou para os outros peões: vê o peão em cima. Elle continuou todo domingo e amansou a tropa toda.
O bravíssimo Chico Gordo
O José Rodrigues era muito importante no Guapé. Elle tinha uma filha que se chamava Bernarda. Casou com o Chico Gordo. Homem importante e bravo. Tinha umas festas no Arraial: novena da coroação de nossa Senhora (que existe até hoje). No fim da reza tinha leilão. No primeiro dia coroou a filha do Chico Gordo e não soltou foguetes. Elle falou: a festa vai ser de cerimônia, não tem fogos. No outro dia coroou a filha de outro homem. Tinha um carro de milho perto da porta da Igreja para ser leiloado. Na hora da coroação soltaram foguetes. Quando o foguete subiu o Chico Gordo foi no carro de milho, tirou um fueiro (que sustenta a esteira do carro) e disse: quero ver quem solta mais foguete. A festa vai acabar hoje. E acabou. Ninguém falou mais nada.
Elle plantou uma abacaxizal na horta, perto da estrada que ia para a Jacutinga. O pessoal estava roubando abacaxi. Um dia ele chamou um camarada, era preto, e chamava Tobias. Era cumpadre delle. Levava um laço e amoitaram (escoderam atrás da moita). O Vitor Emerenciano e o Joaquim Martins, pae do Antonio Martins iam
embora. O Vitor Emerenciano chamou o Joaquim Martins: vamos apanhar abacaxi? O Joaquim Martins disse: eu te espero lá na frente, se tiver muito, você leva um pra mim. O Vitor Emerenciano foi, entrou no abacaxizal, foi apanhando e deixando com as mudas. Foi sair nos pés do Chico Gordo. Elle saiu da moita e apontou a espingarda nelle e falou: amarra elle, cumpadre Tobias. O homem tremendo de medo de morrer. Não fez nada. O Tobias amarrou elle no rabo da mula e o Chico Gordo disse: puxa cumpadre Tobias.Trela os abacaxis com as mudas todas e põe na cacunda delle. E o Chico Gordo disse: puxa cumpadre Tobias. Elle tem que levar os abacaxis.
Lá em Guapé -laía indo- e encontraram o Joaquim Bernardes, pae do Manoel Bernardes e do Lindolfo. Elle com sua mula, ella chamava Guilhermina. O Joaquim Bernardes pediu ao Chico Gordo (para) soltar elle. O Chico Gordo disse: não, puxa cumpadre Tobias. A mulher delle (do Joaquim Bernardes) pediu: solta elle, é moço..(ilegivel). O Chico Gordo disse: solta Tobias, agora falou gente viva(sic). Elle obedeceu o pedido da mulher e não obedeceu o pedido do marido.
Elles tiraram as mudas de abacaxi. Elles levaram os abacaxis para casa. Meu pae contava que as mudas ficaram muito tempo na estrada.
Este Chico Gordo era casado com a Bernarda, filha de José Rodrigues de Ávila e sogra do tio Mizael. Esta mulher eu conheci ela, caducando, morando com o Jucão pae do Lazinho Ávila .
Ascendentes do José Lau
Este terreno que pertence ao Capitólio e a Escarpas (do Lago) era do município do Guapé. E antes, tudo pertencia a Boa Esperança. Para ligar os terrenos dos dois lados do rio fizeram uma ponte de madeira, onde era a ponte Mello Viana.
Esta ponte elles “tratavam” de ponte Branca. Na inauguração dessa ponte (a ponte de madeira) veio uma moça de Cristaes que ficou conhecendo o meu avô, o Francisco Rodrigues de Ávila. Ella chamava Cassiana, da família Pires de Cristaes. Arrumaram ella pra casar com meu avô, porque naquele tempo não usava namorar, casavam. Logo, elle fez casa na fazenda do pae delle. Era na beira do córrego que vem do Olho d´Agua, pra cima do Zé Baio. Começou a criar a família. A mais velha chamava Cota, mãe da Olímpia do José Nico, da antiga Ventania, hoje Alpinópolis. O segundo filho era meu pae, chamava Venceslau Avelino de Ávila, o terceiro filho chamava Evaristo Pires de Ávila, o quarto Mizael, o quinto José Baio, o sexto Antonio Pires de Ávila, o sétimo chamava Reginaldo Rodrigues de Ávila, tinha apelido de Dico, o oitavo chamava João Augusto de Ávila, o nono chamava Francisco Rodrigues de Ávila, tinha apelido de Chiquinho Cassiano. Todos se casaram, só ficou solteiro o Chiquinho.
Meu pae casou pela primeira vez com uma prima, chamada Barbara. O sogro delle era irmão do pae delle. Chamava-se Manuel. Quando meu pae casou elle comprou um terreno perto da Jacutinga. E tirou rego d´agua, assentou mijolo, munho e fez uma casa grande e boa. Este terreno tinha muita cultura, terra de planta. Morou onze anos nesta casa. A mulher delle morreu. A Olímpia era nascida, estava
novinha (Olímpia – mãe da Iolanda – idem). A tia Quezinha pegou ella pra criar. O Mizael morava onde o Tino Quitério morava. Meu pae falava que dever obrigação para os outros é pior do que dever dinheiro. Logo depois a tia Quezinha falou: “cumpadre Lau cede a fazenda pra nós e você arruma outra” Elles já eram cumpadres. Elles eram padrinhos da Olímpia. Meu pae ficou apertado porque elle tinha amor na fazenda, era uma das melhores fazendas do Guapé, mas meu pae por dever obrigação, cedeu a fazenda. O tio Mizael deu aquela fazenda do Augusto Lau, cem alqueires e lá no Mundo Novo aquele pasto de cima em troca da fazenda delle. O tio Miazel ainda voltou dois contos e quinhentos em dinheiro (esta fazenda ficou com o Mizael até a chegada de Furnas, que cobriu a metade dela).
Meu pae falava que este dinheiro gastou todo com inventário (depois da morte da 1ª mulher). E meu pae passou todos os terrenos (das duas propriedades-idem) para os filhos. Elles eram cinco: Maria Barbara, Augusto, Cassiana, Guiomar e Olímpia.
Esta fazenda do Mundo Novo tinha muita terra de planta, terra boa. Antigamente o pessoal só plantava em terra de cultura porque não tinha adubo. Meu pae fez uma casa de esteio de madeira, de chão e de parede de pau a pique, barriada. A casa tinha sala, copa, dois quartos, mais uma varanda, cozinha e um quarto na varanda (O Chico Lau fez uma outra casa onde existiu essa, depois da volta do rio, bem de frente pra Escarpas).
Meu pae foi dos primeiros moradores do Mundo Novo. Elle mudou para essa casa e levou uma creôla velha, que foi escrava. A avó do João Pretinho, para cuidar dos meninos. Ella chamava
Joaquina, eu conheci ella. Lá meu pae fez o casamento de uma filha, a Maria Barbara. Casou com Salatiel Bernardes Coelho. Elle fez uma casa boa, de assoalho, no lugar da minha casinha, deu um alqueire de mato pra elle roçar e plantar café. Meu pae também roçou e plantou um alqueire de café.
Segundo Casamento
Em mil novecentos e dez meu pae casou com minha mãe. E começou a criar a família.
Nasceu a Julieta em 1911. Em dezembro de 1913 nasceu o João Lau, depois do João, um nasceu morto. Em janeiro de 1916 nasceu o José Lau. Em fevereiro de 1920 nasceu o Mario, em março de 1923 nasceu o Francisco. Em 25 de junho nasceu o Antonio. Em julho de 1928 nasceu a Maria, a caçula, que morreu com dez anos.
O aniversário da Mariinha era o mesmo da minha mãe. Minha mãe quando casou com meu pai só tinha 17 anos e meu pai tinha 50 anos. Meu pai era rico e minha mãe era pobre. O pai dela empurrou ela pra casar com um viúvo velho porque era rico. Minha mãe não sabia nem mesmo coar um café e ela aprendeu a fazer de tudo. Trabalhava muito. Meu pai ficou criando as duas famílias. Em 1914 casou o Augusto. A tia Quezinha entregou a Olímpia para meu pai, (quando) ela era mocinha. Ficou pouco tempo morando em casa.
Minha mãe levava a gente para as festas em Guapé. Eram os Congados e a Semana Santa. A Olímpia ia junto. Ela ficou conhecendo o Zé Garcia. E deu
casamento. Quando foi pra ela casar, minha mãe (foi) quem arrumou tudo, meu pae nem ligou. Minha mãe deu muita roupa quente pra Olímpia. Na semana do casamento foi a minha mãe e a Olímpia a pé, me puseram em um cavalo grande com duas malas de roupas acompanhando as duas mulheres a pé. Eu era moleque.
Passando na vargem, do Angola, perto da Jacutinga, a Olímpia escorregou e caiu em um poço de enxurrada e sujou tudo de barro. Foi preciso trocar a roupa para chegar em Guapé. Ficamos na casa da minha avó, no dia do casamento. A festa foi na casa do Zé Garcia. Deu muita cerveja. Quando ia abrindo as garrafas eu ia juntando as tampinhas.
Meu pae nem foi em Guapé. Minha mãe fez tudo para a Olímpia, como se fosse filha dela. Minha mãe estimava muito os enteados. Mas até o Augusto falava que se meu pae casasse com minha mãe ele acabava com tudo que tinha. A Cassiana era muito “custosa”: minha mãe saiu de casa duas vezes por causa dela. Até que ela arrumou um casamento com o Zé Norato* de Capitólio. Mas eles brigavam muito. Sempre separavam e voltavam. Até que separada, meu pai levou a mudança dela pra o Pihumy. Quando o marido dela morreu, meu tio Frederico (que morava em Pihumy) trouxe ela para ver o marido morto. Ficou a Guiomar “biata” (sem casar).
Na passagem dos 50 anos(?), ela casou com o Zé Garcia. Em 30 de maio de 1930 casou a Julieta com o Domingos Evaristo. Em 2 de setembro de 1933 casou o João Lau com a Geralda do Lindolfo. Em 24 de junho de 1938 eu casei com a Luzia. Ela morreu no dia 18 de outubro de 1939 (com 18 anos?). Em 1942 casou o Mario com a Madalena do Antonio Caixito. Em junho de 1947 casou o Francisco com a
Inês. No começo do ano de 1948 casou o Antonio com a Luzia. Em 24 de julho eu casei com a Aparecida do Antonio Evaristo. Em primeiro de junho de 1949, nasceu Lau, no Mundo Novo.
*O capitolino José Norato ajudou no massacre dos ciganos, em 1918, como consta do livro “Capitólio em Prosa e Verso”, pagina 139, do ilustre professor Adil Rainier Alves, que tive o prazer de conhecer, em Capitólio.
Família do José Lau
Em primeiro de junho (de 1949) nasceu o Lau, lá no mundo Novo. Em 10 de outubro de 1950 nasceu a Cleida, lá nos Rodrigues. Eu não estava em casa e quando me chamou lá no Mundo Novo, eu vim e encontrei a comadre Zica dando chá para ella. Em 26 de janeiro de 1953 nasceu a Clere, lá nos Rodrigues. Em 10 de agosto de 1954 nasceu a Nini, lá nos Rodrigues. Nasceu o Warley nos Rodrigues e morreu em Guapé com um ano e meio. Em 20 de dezembro de 1956 nasceu o Nero. Em 18 de março de 1959 nasceu a Teninha. Em 2 de fevereiro de 1957 morreu minha querida mãe. Morreu em Guapé. Meu pae nasceu em 22 de agosto de 1860 e morreu em 17 de março de 1950. Minha mãe nasceu em julho de 1893 e morreu em 2 de fevereiro de 1957. Casou em 1910. Ela morreu em Guapé, na casa dela, na avenida dona Agostinha. Nasceu a Consuela em 28 de junho de 1961. Nasceu a Maria em 1 de agosto de 1965 e em 27 de outubro de 1967 nasceu o Valério.
A família Evaristo só agrada uma pessoa quando tem interesse.
Últimos anos do José Lau
No dia 4 de abril de 2000 morreu a Mariana, esposa do José do João Lau. Eu fui ao enterro no Capitólio. Foi a Aparecida, a Clere e a Maria. O enterro foi às oito horas da manhã. Tinha muita gente Quando nós voltamos, para atravessar a balsa estava ventando muito. Chegamos em casa às onze e meia. Quando foi nove horas me pegou uma tosse e a pressão subiu, me deu falta de ar e pensei que ia morrer. A Clere veio pra me levar para o hospital, eu não queria ir, mas quando vi que não agüentava, aceitei. Entrei no carro, só eu e a Clere. Pensei que ia morrer dentro do carro. Entrei no hospital, tomei remédio a noite inteira. Voltei pra casa às nove e meia da manhã.
Casa do avó materna
Eu conheci o Guapé quando ainda era vila. Minha avó morava na rua principal, bem abaixo da praça, perto do ribeirão. Uma rua bonita, que pegava no ribeirão e subia em linha reta até o outro lado do arraial. A casa dela tinha a frente na rua e um terreno grande O fundo ia até o ribeirão. Meu avô (materno?) plantava de tudo na horta. Tinha milho, mandioca, bananeira. Fazia polvilho pra tratar de doente(?). O tio Avelino vendeu duas posses e ainda ficou grande e não deu nada pra minha mãe. Na frente da casa tinha um calçamento de pedra para cercar a enxurrada.
Quando subia carro de boi fazia muito barulho. Eu e o João Lau corríamos pra ver. A enxurrada corria esparramada na rua, não tinha sarjeta, nem meio fio. Não tinha luz e as casas eram iluminadas com
luz de querosene e aqueles mais ricos tinham lampião.
Tinha duas igrejas que eram iluminadas com lanterna de azeite de mamona, feito em casa. Não tinha água encanada. Eles serviam (sic) com água de cisterna. Aqueles que não tinham cisterna serviam com água do vizinho. Os buracos das ruas eram consertados com picareta. Cada um cuidava da sua frente porque não tinha prefeitura. Não tinha privada, eles faziam um buraco, colocavam um caixote de madeira pra pessoa sentar.
O arraial era só da Rua Araúna para baixo. Acima era tudo mato e no meio do mato tinha umas casinhas e tinha alguns trilhos.. onde o pessoal pousava.
.Não tinha açougue, eles falavam em corte de vaca e era junto com a venda. O esteio de amarrar era na rua. O pessoal vinha ver matar as vacas. Tirava o couro, espichava com varas de bambu e os cachorros juntavam para lamber o sangue. Eles picavam a vaca e vendiam um pouco. Punha em um tabuleiro e saiam vendendo, o que sobrava punham no sal e secavam, porque não tinha geladeira.
Minha mãe levava nós sempre nas festas do Congo e do Moçambique e na Semana Santa.
Meu pae tinha três camaradas, que moravam conosco, um chamava Bernardo, o outro Ernestino e o outro Sebastião Mariano. Todos os três solteiros. Quando a gente ia nas festas, eles iam também, ficavam na casa da minha avó. Nós meninos, andávamos com os camaradas. Os meninos do arraial batiam nos meninos da roça.
Primeiros carros em Guapé
Quando veio o primeiro carro a gasolina, era do Otavio da Duca. Um Fordinho de mola de Aço, pneu fino. Elles cobravam pra dar voltas. Os camaradas do meu pae arrumavam namoradas e pagavam pra dar voltas nos carros, no largo(na praça). Custava seiscentos réis. Entravam com a namorada no carro. Eu entrei também. Saia um, entrava outro. Aí eu fiquei. Entrou o terceiro. Fiquei dando muitas voltas no carro. Gostei muito. Quando eu fui pra roça, só ficava falando no carro: como ele fazia, como ele balangava muito, quando tinha gente na rua, ele fazia piu....piu....piu...!!!.
A rua era escura, só iluminavam os faróis do carro.
No fundo do arraial tinha um ribeirão. O pessoal que vinha da Jacutinga, do Pontal, do Mundo Novo, da Pedra Branca passava dentro d´água.
Quando trazia defunto no “bangüê”, o bangüê (de origem africana) era um pau amarrado por cima do caixão, pegava um na frente e outro atrás, quando atravessava o ribeirão e depois pegava em quatro pessoas para andar na rua.
Minha avó buscava paus para fazer lenha. Perto do cemitério morava meu tio(tio???), ele plantava abacaxi e colhia muito. Ele vendia e ficou com o apelido de Zé Abacaxi. Na horta ele tinha uma cova de bananeira nanica. Nesta bananeira deu um caixo muito grande, quando amadureceu. Ele cortou o caixo de banana e pôs na sala e abriu uma venda. Veio um homem comprou banana e gostou muito e falou pra ele contar as bananas. Eu vou levar tudo, ele falou. Elle disse: não posso vender tudo. Tinha que servir a freguesia.
O segundo carro quem comprou foi o Dr. Sano. Carro moderno. E fez a linha para o Capão Quente.
Essa linha descia para os Penas até a ponte do rio Sapucaí, para ir pra Passos. Quem vinha de Passos para Guapé tinha que passar no Capão Quente. Esta linha foi feita toda no picarete. Antes o Dr. Sano andava de cavalo.
O terceiro carro quem comprou foi um fazendeiro das Posses, José Pereira. Era um fordinho de mola de aço e pneu fino. O homem que vendeu pra elle ensinou a dirigir. E levou o carro lá nos Penas, pela estrada de carro de boi. E elle todo dia treinava. Amarrava as porteiras do curral. E fazia todas as manobras mas não aprendia a frear. Um dia elle viu que estava bom no volante e elle mandou os camaradas subir nos estribos, um de um lado e o outro do outro lado e saiu pela estrada. Deu num lançante abaixo e elle não sabia frear e o carro pegou embalo. Os camaradas pularam fora. Elle parou numa cerca de arame e afundou num brejo e apagou. Elle saiu do brejo e disse que precisava de uma manivela. Foi preciso pagar para tirar o carro do brejo. FIM
((Em que data foi esta ultima anotação? – Não sei. O Papai anotou no alto dessa agenda a pagina “65”. O que sei é que tudo isso foi no ano 2000, o ano em que o papai nos deixou, isto foi às 13h45 do triste dia 6.12.2000.